reflexão

Os arquitectos são hoje forçados, pelo próprio condicionalismo socio-económico em que a sua actividade se exerce, a interrogar-se sobre o tipo de responsabilidade social da Arquitectura e sobre a rentabilidade social da sua função de arquitectos.
Entendendo a arquitectura como modelação de espaços praticáveis interiores ou exteriores ela não pode, porém, ser considerada um «luxo» desde que, através do trabalho de grupo e do diálogo com as Ciências Humanas, se situe numa relação dialéctica com a realidade social.

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SAAL

A 27 de Outubro de 1976, um despacho conjunto do Ministro da Administração Interna e do Ministro da Habitação, Urbanismo e Construção encerra um período de cerca de dois anos durante o qual, desde Agosto de 1974, se desenvolveu aquilo a que ficou chamado o “processo SAAL”.
O 25 de Abril desencadeia uma nova fase de luta pelo direito à habitação marcada, fundamentalmente, pela poderosa iniciativa dos moradores dos bairros pobres que se organizaram e levam a cabo processos reivindicativos e acções sucessivamente mais agressivas que então desarticulados aparelho de estado dificilmente podia conter.
É assim que, em Agosto de 1974, por despacho do Ministro da Administração Interna e do então secretário de estado da Habitação e Urbanismo, arquitecto Nuno Portas “aparece” o SAAL, Serviço Ambulatório de Apoio Local, “corpo técnico especializado” que numa primeira “fase experimental” e “face às grandes carências habitacionais designadamente nas principais aglomerações, aliadas às dificuldades em fazer arrancar programas de construção convencional a curto prazo” se destinava a “apoiar, através das Câmaras Municipais, as iniciativas da população mal alojada…”. O mesmo despacho definia as acções a empreender por esse mesmo “corpo técnico especializado” como de acções fundiárias, acções de projecto, acção de assistência na gestão social e recordava que “a principal justificação desta política está na aproximação de locais valiosos pelas camadas populares neles radicadas sob forma marginal”.
Desde logo, e qualquer que tenha sido (ou seja ainda hoje) as leituras possíveis do despacho publicado a 6 de Agosto de 1974, em plena vigência do segundo Governo Provisório, certo é que, frente-a-frente ficavam, a partir de então e de um modo diferente, aparelho de estado, moradores de bairros pobres e degradados e técnicos ligados ás questões da habitação e do planeamento que por diversas que por diversas formas se vieram a relacionar entre si levando assim acabo e ao longo de mais de dois anos aquilo que foi uma das mais ricas experiências conhecidas no campo da habitação. É desta relação que vêm a resultar, no sempre diferente confronto com s realidade local, diferentes orientações do “processo”, sua metodologia, incidência e resultados.

Cidade campo, N2 movimento popular e pratica urbanistica em Portugal;

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Direitos Urbanos

Outra via que conduz igualmente à coesão social passa pela constituição e pela afirmação dos direitos urbanos. A partilha dos mesmos direitos produz reconhecimento; a sua operacionalização e o seu desenvolvimento constituem um projecto colectivo. A sua existência tem consequências para o urbanismo, porque se encarrega de os inscrever nos equipamentos e nos serviços. É possível fazer a cidade a partir da operacionalização dos direitos. O direito ao acesso para os deficientes motores, visuais ou cegos pode orientar um conjunto de escolhas respeitantes à arquitectura ou ao ordenamento do espaço público e tornar-se um recurso em vez de um constrangimento. A definição rigorosa, a articulação e a hierarquia dos direitos urbanos – com as dificuldades e controvérsias que isso acarreta – constituem um quadro de referência de um urbanismo preocupado com a coesão social. Amanhã o urbanismo concederá grande atenção a estes direitos urbanos, em especial aos novos direitos.

Quais são eles?
Para além dos já estabelecidos há mais tempo e que, sem se limitarem à cidade, continuam a ser fundamentalmente urbanos, como a liberdade de pensamento e de expressão, o direito à habitação e ao trabalho, Alain Bourdin enumera mais quatro que explicitam a necessidade de evolução de uma cidade moderna: o direito ao acolhimento, o direito à mobilidade e ao acesso, o direito a um ambiente satisfatório e o direito à segurança.

O direito ao acolhimento aplica-se a todos os que chegam, tanto aos novos habitantes como aos que apenas estão de passagem.
A imigração é hoje examinada através de um debate sobre a identidade nacional. Seria muito mais claro atermo-nos à definição dos diplomas que regem o exercício do direito de acolhimento aos imigrantes e aos que pedem asilo. Encontrar-se-ia a questão da língua e do respeito pela lei republicana, mas evitando qualquer derrapagem substancialista (numa palavra, a divinização da identidade nacional) e não esquecendo que os limites do direito não fazem sentido a não ser que este se exerça efectivamente: nada se pode exigir daqueles a quem nada se oferece. De uma perspectiva diferente, que recepção no “mundo local” é dada aos turistas e aos visitantes, que forma de respeito é esperada por parte daqueles que ficam e como pode exprimir-se esta expectativa?
As respostas a estas questões ultrapassam o urbanismo, o qual pode, contudo, dar um contributo. Na Suíça, desenrolou-se uma reflexão sobre os equipamentos destinados aos que solicitavam asilo, sobre a sua localização e características. Esta desencadeou uma observação de conjunto sobre a cidade e a sua capacidade de aceitação de usos e modos de vida diferentes. A concentração de populações que entram nos bairros – rapidamente baptizados como “guetos” – mereceria que se perguntasse se a possível passagem por esses lugares não faz parte do direito ao acolhimento, desde que eles tenham ligações suficientes com o resto da cidade e de que deles se possa sair. O direito ao acolhimento tem necessidade de lugares, para que se exerçam algumas das suas dimensões base: a informação, a protecção provisória, e para que se possa explicitar o seu conteúdo, os acordos que o guiam, o contexto em que ele se exerce. Existem centros de interpretação, como os do património, que se definem como: “Um centro de interpretação tem por ambição fornecer ao público as chaves de leitura de um património, natural ou monumental, arqueológico ou industrial, ou até um conjunto urbanístico ou ambiental. Os ofícios e o seu saber-fazer são igualmente visados, dado que se trata não somente de transmitir conhecimentos aos visitantes mas também de os fazer amar o património e transmitir os seus valores”. Porque não criar centros de interpretação da cidade e da vida urbana, tendo por objecto o acolhimento?
O direito à mobilidade e ao acesso implica, em primeiro lugar, a possibilidade de deslocação pelo território e no interior das cidades. Esta é medida considerando a situação daqueles que têm dificuldade em deslocar-se, por razões económicas (custo), de deficiência, seja ela qual for, de localização longínqua muito pouco acessível ou isolada. Como permitir a um pobre que exerça o seu direito à mobilidade na equidade e em condições que não cause prejuízo à colectividade? Isto depende da responsabilidade social. Ao invés, que compromisso deve cada um de nós assumir para que o exercício do direito individual à mobilidade não vá contra o interesse geral? Esta perspectiva não se substitui ao trabalho dos especialistas de transporte e da mobilidade nem à reflexão em termos da oferta; dá-lhe orientações e constrangimentos, chegando nomeadamente a não fazer da transferência modal (do transporte individual para o colectivo) o critério principal, ou mesmo único, da avaliação da oferta de serviços de deslocação.
O direito ao acesso não se limita à mobilidade. Apoia-se na informação, nos serviços públicos e mais globalmente na oferta urbana. Comanda a definição do grau de privatização aceitável de certos lugares (espaços públicos, monumentos), equipamentos (centros comerciais), serviços, e intervém a par do cálculo económico no estabelecimento das tarifas. O direito de acesso aos recursos urbanos oferece uma tradução contemporânea da igualdade republicana. Sobre o plano operacional, introduz uma leitura da cidade que obriga a associar o funcionamento (dos equipamentos, por exemplo) à localização e a ultrapassar a redução das deslocações a fluxos de seres humanos considerados como bolas de bilhar.
O direito a um ambiente satisfatório equilibra o “todos ambientalmente culpados” que aparece hoje como dominante por via da questão das alterações climáticas. Através dele, afirma-se a subida em importância da consciência ecológica, exprimindo exigências que dizem respeito à qualidade do ar (nomeadamente no interior das habitações) e da água, da alimentação (e o acesso aos recursos alimentares que apresente garantias ambientais), à possibilidade de preservar e melhorar o seu estado físico com o exercício, à prevenção, etc. Um dos seus componentes formularse-á prudentemente como “a presença da natureza na cidade”. Tratar-se-á de um direito à biodiversidade, de um direito à paisagem? A questão continua a ser controversa, mas junta-se ao enigma da estilização da cultura. Em compensação, o carácter convencional deste direito é inquestionável. Ele implica, por exemplo, que cada um use de boa vontade ao fazer a triagem do lixo.
O direito à segurança não se confunde com uma estratégia, a da “tolerância zero”. Em primeiro lugar, porque a segurança se aplica para além dos riscos ligados à delinquência; de seguida porque a ausência total de risco em qualquer lugar, objectivo (de resto, irrealizável) implícito na ideia de tolerância zero, constitui uma definição entre outras, e perfeitamente discutível, do direito à segurança. Outra definição consistiria em dizer que o indivíduo deve poder dominar fortemente o seu ambiente e encontrar na cidade lugares onde ele não tem necessidade de estar sempre alerta para se defender. Isto alimenta a reflexão sobre a proximidade e a geografia dos “lugares-refúgio” (eventualmente diferenciada segundo os tipos de população) no espaço urbano. Contudo, a segurança continua a ser um sentimento, no sentido de uma coincidência entre si e si mesmo, como o sentimento da existência, e, como tal, não se cinde. Sem segurança no trabalho, no habitat, nas relações afectivas, há poucas possibilidades de que o direito à segurança urbana possa funcionar.

Bourdin, Alain, (2011) O urbanismo depois da crise, Livros Horizonte.

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Os lugares de coesão

A coesão social, por mais impreciso que seja o termo, substitui o de sociedade. A ordem social imanente perde a sua força de estruturação em proveito das regras do jogo construídas e redefinidas sem cessar. O sentimento de pertença a grupos muitas vezes “naturais” dá lugar às escolhas electivas e às colectividades de projecto. Esta evolução dura há tempo suficiente para que as suas consequências sejam hoje visíveis. A coesão social passa pelo conhecimento dos outros, pelo seu reconhecimento e participação num projecto comum, mesmo que limitada ou ténue. Interage ainda com a solidariedade “orgânica” de Durkheim, portanto, com a complementaridade entre indivíduos, mas cristaliza sobretudo o que François Archer e Francis Godard designaram como “terceira solidariedade” e que François Archer definiu: “esta nova solidariedade é assim feita de laços fracos ou mesmo frágeis, mutáveis e diversificados, mas numerosos e em larga medida escolhidos, que associam indivíduos às suas pertenças sociais igualmente múltiplas, numa sociedade aberta [ … ] esta solidariedade reflexiva [ … ] fabrica assim um tecido social bem diferente dos tecidos da primeira e da segunda modernidades e das suas solidariedades mecânicas e orgânicas: os fios que o tecem são mais fracos e mais frágeis, mas o tecido não é por isso menos resistente do que aquele que era constituído por fios grossos, mas pouco numerosos: tinham mais elasticidade. Além disso, os seus fios, cada vez mais escolhidos pelos indivíduos em paletas cada vez maiores, formam padrões variados. O remendar incessante do tecido dá-lhe também reflexos variados.”
Em resumo, a coesão social seria o trabalho permanente de construção, manutenção e compatibilização de redes relacionais frágeis, mas muito diversas, através de um processo de reconhecimento e de mobilização em torno de projectos comuns.
Como fazer uma cidade que facilite a coesão social? O conhecimento e o reconhecimento podem encontrar um apoio nos lugares, e esta constatação serve de base a uma problemática pouco habitual da mixidade social. Com efeito, de nada ou de quase nada serve pôr gente diferente lado a lado; os efeitos da proximidade são coisas bastante complexas, de que as numerosas pesquisas existentes demonstram tanto os inconvenientes como as vantagens. Em contrapartida, a criação de situações em que estas se possam encontrar, conhecer-se ou reconhecer-se tem todo um outro alcance. Estas situações colocam no terreno mediadores, sejam eles pessoas, acções ou locais. A encenação das práticas dos outros e a partilha dessas práticas, podem contribuir para os processos de conhecimento e de reconhecimento.
Os locais adequados estão ainda por inventar. Existem princípios no marketing da Starbucks que organizam os seus estabelecimentos de tal forma, que os adolescentes que nunca tinham frequentado um café e que nunca se atreveriam sequer a entrar se sentem ali tão à vontade quanto os clientes habituais, bem como nas reflexões sobre o metro enquanto lugar de sociabilidade e não somente de deslocação, ou até na organização de certos cibercafés inovadores.
Isto não impede que, sem projectos para partilhar, a coesão social tenha poucas probabilidades de se estabelecer. São precisos promotores de projectos, responsáveis políticos, líderes e animadores sociais de toda a espécie, amadores ou profissionais, assim como apoios que, no caso de se tratar de lugares ou de objectos urbanos, dependem do urbanismo. Neste sentido, portanto, em oposição ao gesto do arquitecto demiurgo, fazer cidade é fazer sociedade.
Bourdin, Alain, (2011) O urbanismo depois da crise, Livros Horizonte.
Ao escrever isto, Alain Bourdin quer que se reconsidere a questão da cidade acima mencionada. Mais do que querer fazer uma cidade que responda à procura explícita de uma comunidade (o que continua a ser, como habitualmente e apesar de tudo, a ideia implícita neste género de actividades) e que suscite um consenso, preferimos mobilizar redes de utilizadores – ainda que muito intermitentes – e de habitantes diversos para produzir e fazer funcionar a cidade numa diligência que não exclui nem os conflitos nem mesmo as incoerências. A coesão social virá por acréscimo. Em suma, se se admitir que, na falta de uma sociedade local, a cidade tem necessidade de coesão social para funcionar, a constituição de dispositivos e de lugares que favoreçam o processo de coesão, favorecem a correlação e interacção dos habitantes, participando assim num projecto comum que os ligaria entre si e aos espaços, desenvolvendo o sentimento de pertença e estimulando o sentido empreendedor de cada um para bem da sua comunidade.
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Urbanismo de coesão social

A coerência das cidades tradicionais não se baseava na sua composição espacial, mas no facto de que elas constituíam sociedades organizadas e hierarquizadas. Hoje, a realidade urbana é sociologicamente diversa, fragmentada, contraditória, e já não tem quase nada de uma sociedade.
O urbanismo defende que a cidade faz sociedade. Por vezes, pretende pôr em ordem esta sociedade. Esta hipótese, durante muito tempo razoável e justificada, perde todo o valor. O que resta das sociedades urbanas constituídas, não impede o enfraquecimento tendencial das estruturas sociais localizadas e o domínio de laços electivos ou contratuais, por vezes frouxos e frágeis, que provêm de compromissos individuais.
Nos países mais mundializados, a cidade-comunidade já não existe senão em pequena dimensão e em zonas esquecidas, salvo se ela se tornar um gueto de ricos ou de emigrantes. O bairro-aldeia ainda presente nas fantasias de muitos urbanistas já não tem outra realidade. A denúncia das gated communities ou dos guetos, por vezes excessiva, torna-se legítima perante a vontade de ruptura com o contexto social (para lá da simples protecção), afirmada pelos reagrupamentos que se recusam a pagar impostos para os outros, ou de respeitar as leis do país.
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Lx Factory- Há 150 anos era uma fábrica de fiação e tecidos, hoje é uma fábrica de ideias

A Lx Factory nasceu no espaço da Antiga Companhia de Fiação e Tecidos Lisbonense do século XIX, junto ao Largo do Calvário em Alcântara, e converteu-se, em pouco tempo, numa ilha criativa na cidade. Com cerca de 120 empresas e espaços comerciais instalados, é hoje um ponto obrigatório de visita.

A Lx Factory foi criada pelo grupo de investimentos imobiliários MainSide para gerir o espaço comprado à Gráfica Mirandela. No projecto da empresa para o local estão previstas zonas de habitação, comércio e serviços, mantendo a faceta industrial nos três edifícios principais, para não descaracterizar a zona, e não se perder parte da história da cidade. A construção deste complexo fabril remonta à década de 40 do século XIX e foi dos primeiros a adoptar uma tipologia típica da arquitectura do ferro em Portugal. Numa Lisboa repleta de prédios e espaços devolutos, a LxFactory demonstra que é possível rentabilizar e contornar problemas de uma forma inteligente, haja criatividade e dois dedos de testa.

O espaço, englobado no plano Alcântara XXI da Câmara Municipal de Lisboa, aguarda a aprovação do plano de pormenor para os terrenos e edifícios do antigo complexo fabril num processo que tem sido mais demorado do que o previsto inicialmente. Há males que vêm por bem. Enquanto a renovação não acontece, os 23 mil metros quadrados são temporariamente devolvidos à cidade numa explosão de criatividade por um tempo indefinido.

Na antiga fábrica há de tudo um pouco: agências de publicidade, produtoras de cinema, moda e audiovisuais, ateliers de design e arquitectura, músicos, uma escola de dança, restaurantes, esplanadas e até uma livraria, que espelha todo o ambiente fabril desta mini cidade criativa.

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Igrejas na Holanda

Com o avançar dos anos há espaços que vão ficando esquecidos. Foi o que aconteceu com as igrejas e templos na Holanda, que se transformaram em pubs, cafés, livrarias e até mesmo espaços de espectáculos.
Essas transformações ocorreram porque as instituições religiosas não tinham recursos para manter as construções acabando estas por ficarem vazias.
A ultima sondagem realizada no país indica que 44% da população é ateia, 28% católica, 19% protestante, 5% muçulmana, 4% de outras religiões.
Apesar de os crentes serem a maioria da população, os holandeses não têm o costume de culto, por isso não frequentam igrejas nem templos para praticarem os seus dogmas.
Exemplo deste reaproveitamento urbano é a livraria Selexyz que se encontra na igreja de Maastricht, que foi  considerada a mais bela livraria da Europa pelo The Guardian.
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Cidade Criativa

A cidade criativa como horizonte
A concorrência conduz-nos à inovação e à criatividade. A ideia de que o urbanismo liberal se faz a partir da cidade, repousa sobre uma constatação: poucas cidades, sobretudo grandes e em países ricos, vivem da sua função de capital local, isto é, da animação de um território que funciona mais ou menos em circuito fechado.
(…) Na economia mundializada e cognitiva, os especialistas põem-se de acordo para associar a capacidade de concentrar riqueza, pelo menos fora da economia residencial, com a inovação. As actividades económicas locais mais inovadoras suportariam o desenvolvimento urbano.
(…)Tudo resulta da imagem de grupos sociais efervescentes (muitas vezes designados como inovadores), cuja importância parece reconhecida quando se torna necessária uma forte componente criativa, nomeadamente no caso do design e de uma parte da pesquisa, mas que se estende à inovação, mais classicamente tecnológica quando esta depende das relações entre pesquisa e indústria.
Um grupo social efervescente não se obtém por decreto; são os seus actores que o constroem ao longo do tempo. Apoia-se num tecido de relações e resulta de uma história, de uma aventura levada a cabo pelos seus interpretes. A sua história dá-lhe um sentido associando-o a características específicas, dos locais, dos ambientes, a um dado “clima social e urbano”.
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Inovação, criatividade, cultura
Muitos crêem que basta criar grupos sociais efervescentes para que o resto se siga: a inovação desenvolverse-á nas suas diversas dimensões e produzirá uma riqueza que será captada localmente e que permitirá fazer funcionar toda a máquina urbana. Este raciocínio torna-se tanto mais um dogma quanto
mais elementos factuais existirem para o confirmar. Duas condições interdependentes permitiriam chegar aí: atrair a população inovadora (investigadores, criadores, etc.) e criar um ambiente de inovação.
(…) Os trabalhos existentes concluem bastante claramente que a inovação está ligada a uma forte proporção de diplomados de alto nível e que a presença de formações universitárias prestigiadas e dinâmicas constitui um facto de desenvolvimento da inovação (pelo menos no sentido da pesquisa-desenvolvimento).
Para além disto, pode imaginar-se o que quer que seja no paralelismo entre a atracção de uma população considerada criativa e a elaboração de uma oferta urbana destinada a criar um ambiente de inovação.
(…) Para explicar este sucesso, ponhamos a hipótese de que o urbanismo tem tanta necessidade de um grupo social de referência como de um poder que o sustente.
(…) Seja como for, espalhou-se a crença de que existe um grande grupo portador da inovação – que é o ponto nevrálgico do sucesso urbano – e de que a aposta do urbanismo consiste em favorecer o desabrochar deste grupo, criando um ambiente de inovação à escala da cidade.
(…) Então, a crença resume-se a isto: façamos cultura, de preferência espectacular; assim atrairemos os portadores de inovação e teremos a inovação de que a cidade necessita para criar os círculos virtuosos de riqueza.

Bourdin, Alain, (2011) O urbanismo depois da crise, Livros Horizonte.

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No money, no building

“(…) A crise que abalou o pacato frenesim do universo económico-financeiro mundial tem gerado uma estagnação do investimento associada à redução de custos de grandes empresas com efeitos directos em grandes encomendas de arquitectura. A crise activou um princípio do tipo ‘no money, no building’ tomando como primeira vítima a arquitectura mainstream; precisamente a “corrente” que até agora tinha estado ao serviço da hegemonia dos grandes poderes económicos tornou-se na mais exposta aos cortes orçamentais das grandes multinacionais, outrora empenhadas na prática da auto-afirmação, explorando o valor mercantil e representativo da arquitectura e do arquitecto-marca. A mediatização e fama destes nomes tornaram-nos apetecíveis pelos grandes interesses privados e pelo “valor acrescentado” implícito na sua assinatura. (…)”
Tiago Borges, O que se segue?, Arte Capital, 2009
Os gigantes privados que apoiavam a mediatização, são arrasados pelo declínio da corrente mainstream-   “em vez de representar uma riqueza pessoal ou o poder de um país, os mercados especulativos – sejam eles financeiros ou arquitectónicos – actualmente espelham a fraqueza de um império em declínio”, expôs Mark Taylor num artigo publicado na revista Log antes do eclodir da crise.
De acordo com a conjectural socio-economica actual, não há grande margem para investimentos que suportem a livre criação artistica recomendada a arquitectos-marca que, dados o reconhecimento da sua obra, requerem um “budget” mais elevado. Para contrariar os tempos de crise, surge o reaproveitamento urbano, que pode inspirar a criaçoes de edifícios que perderam o propósito para o qual foram construídos reaproveitando-os para outro fim. Todo este investimento de reaproveitamento, sai claramente mais barato que a construção de um edificio de raiz, com o benificio da originalidade de como foi aproveitado.
Independentemente das iniciativas e da procura incessante do onde investir, como, e porquê, a crise tornou-se num estado de espírito cujo componente medo trabalha por antecipação e com um estranho poder paralisante, desincentivando o investimento.

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O desgaste urbanístico dos centros antigos

(…) As condições de higiene destes bairros de ruas estreitas só se tornaram deploráveis em razão do seu empobrecimento e da sua falta de manutenção. O verdadeiro inimigo da saúde pública não são as casa velhas, mas o monstruosos aquartelamentos onde se concentram centenas de habitantes.
(…) Não concluo que tudo vá bem nos centros antigos e que não seja necessário mudar nada. Da mesma maneira que, por todo o lado, se combate agora este grandes aquartelamentos tentando melhorar o que pode ser no que já existe, nos degradados (os mais recentes datam apenas de uma vintena de anos), da mesma maneira é necessário arejar e iluminar os bairros onde mal se respira (…).
Transformar e renovar, portanto, mas com medida, sem fazer tabúa-rasa, mas apoiando o que já existe. Nada de mais ilógico e ineficaz que os “esventramentos” hoje tão estimados, que não são ditados, como se pretende, por considerações de higiene, mas pela retórica arquitectural e pela especulação privada, ávida de monopolizar os terrnos situados no centro da cidade (…).
É, por vezes, necessário, contudo, abrir novas vias para o interior dos centros antigos, quando a deslocação do centro urbano não é planificada em tempo desejado (…).

Exemplo de Roma, Il “diradamento” edilizio dei vecchi centri: il quartiere della Rinascenza in Roma, Nouva Antologia, XLVIII, 1913, Páginas 53-76.
As questões do património, Antologia para um combate, Françoise Choay; Página 197-198

Mais que querer reconstruir é necessário concluir onde a reabilitação é necessária. Os centros antigos, em todas as cidades são locais apreciados de reuniam e habitação. Quebrar o tradicionalismo que estes espaços acarretam e construir falsos aspectos, devido à especulação moderna das grandes cidades, constituem irreparáveis notas falsas por todo o lado onde o tecido tradicional criava uma atmosfera própria e atractiva, afastando assim a possibilidade de proximidade da cidade com quem lá habita.
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